quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Capitulo 8 - Parte qualquer coisa

- Aquilo, o quê?
- A galinha! Ias a correr, ela falou comigo, e tu, durante todo esse interlúdio, mencionaste o não-sei-quê do ritual…
- Ah, isso!
E Zaen, não a deixando continuar, perguntou:
- És satânica?
- Sa… quê?
Com isto, Zaen viu todos os seus receios aflorarem-se-lhe à pele. Afinal aquilo não era propriamente a sua casa. Eles não sabiam o que era o satanismo. Mas, afinal, para que quereriam uma galinha preta?
Niel, como se lhe adivinhasse o pensamento, começou a explicar:
- Eu não sei bem a que te querias referir com isso do sata… qualquer coisa. Nós aqui no R7P3I somos todos… quer dizer, acho que há alguns que não acreditam bem nisto, mas só pela piada, também participam.
- E essa… hum… religião, tem nome?
- Nós não temos nome para a religião, pois ela é o tudo e o nada, é a presença da ausência, é o infinito num espaço restrito, é espaço e tempo, é fogo e água, é…
E aqui Zaen deixou de ouvir, pensando "É uma sensação de absorção, mas ao contrário…", enquanto Niel debitava o que a tia lhe tinha ensinado e o que todos os habitantes do Reino aprendiam em crianças quando faziam aquela pergunta aos pais.

Capítulo 8 - parte VI

Depois de, finalmente, apanhar a galinha e de a deixar numa outra divisão, Niel voltou para junto de Zaen.
- Hum… A tua cara não me é estranha – disse-lhe.
- Errr… Terra? Cemitério? Diz-te alguma coisa?
- Ah, claro! Zaen, certo? Desculpa, não te tinha reconhecido, estás um bocado mais branco…
- Pois, é uma longa história – disse Zaen. E perguntou, ainda intrigado com a cena digna de Monty Python a que tinha assistido com a galinha, – o que raios foi aquilo?

Capítulo 8 - Parte V

A rapariga parou, encolheu os joelhos e com o impulso necessário, atirou-se para a frente. Zaen estacou e olhou para a cena. Niel voava, bracejando e dando às pernas como se estivesse a nadar no ar. Ele pensou: “Epá, grande jogada! Assim apanha a galinha de certeza. E é gordinha, dava uns ricos hamburgers de aves.”

Parecia uma cena tirada de um filme sobre jogos de basket, em camera lenta. Lá ia Niel a voar, ou melhor, a nadar no fluido gasoso a que damos o nome de ar. A graciosidade inexistente com que se movia assustou os pobres morcegos que assistiam à deprimente cena de cabeça para baixo, com as patinhas agarradas às traves que cruzavam o tecto.

Lá ia Niel pelo ar. Estava a 1 metro da galinha… 50cm… 10cm… -2cm… -50cm… -1m… -2m…

Lá aterrou Niel 5 metros depois da galinha, que parou e inclinou o pescoço par ao lado como os cães fazem quando observam algo realmente estúpido. Esticou uma pata para o lado, rodou sobre si própria e começou a andar para trás, na direcção de Zaen. Niel ficou quieta no chão a dizer asneiras. Levantou-se murmurando muitos ais e uis e voltou-se.

- Apanha a bicha! – gritou ela para Zaen.

- O quê? O que é uma bicha? – perguntou ele, confuso.

Niel bateu com uma mão na testa, enquanto murmurava:

- Este gajo é tão estúpido que até parece ser meu pai!

A galinha parou em frente a Zaen e levantou a cabecinha. Zaen olhou para a galinha, a galinha olhou para Zaen.

- Olá, toino – disse a galinha.

Zaen mandou um grito e trepou pelo pilar mais próximo, agarrando-se a ele como quem se agarrava à vida. Quando Niel chegou ao pé dele, tocou-lhe num ombro. Ele abriu os olhos a medo. Tremia violentamente.

- A… a… a galinha falou! – guinchou ele.

- Mas tu vens de que mundo, pá? – perguntou-lhe Niel. Mas não esperou pela resposta dele, voltando a correr atrás da galinha. – Anda cá, pita, pita…

Capítulo 8 - Parte IV

Portanto, e como já devem ter entendido, aquele dia era o Dia da Galinha Preta e de Todas as Galinhas de Todas as Cores Porque Somos Góticos Mas Não Somos Racistas.

Capítulo 8 - parte III

O pobre Zaen não fazia ideia de que tinha chegado ao R7P3I, onde milénios de isolamento tinham levado à evolução (?) extrema da religião wiccan gótica para um nível tal que cada dia era dedicado a um animal, que era alvo dum ritual de adoração ao fim do "dia" (portanto, no chamado "pôr-do-pentagrama").

Capitulo 8 - Parte II

Olhou para a porta da sala e viu que dava para um corredor. Viu uma galinha preta a correr e uma rapariga (que se parecia muito com aquela que tinha visto no cemitério) a correr atrás da galinha e a falar para ela.
- Anda cá, galinhazinha… pita, pita, pita… Ai, a Ceridwen vai-me matar se eu não levar a galinha a horas para o ritual.
Zaen resolveu correr atrás da rapariga, que ele tinha a certeza de ser a Niel e que, aparentemente, era satânica como ele.

Capítulo 8 - De volta ao Reino...

Anfira quase se afogava em lágrimas; os seus super-poderes cristãos davam-lhe uma capacidade sobre-humana de chorar como uma Madalena (não a nossa, a outra…) e Vyrmack já tinha água pelos joelhos, ele que até era um tipo alto.

Entretanto, do outro lado do wormhole, Zaen só conseguia pensar "OK, morri e fui para ao céu… inferno… pois, isso…", porque deu por si numa sala gótica (arquitectura gótica, decoração gótica, tudo-o-que-se-lembrarem gótico) e, portanto, bastante negra. Sentiu-se em casa. Quer dizer, tecnicamente, estava em casa, só que ainda não o sabia.

Capitulo 7 - Parte III

- Da última vez houve um palácio que teve que ser redecorado devido à excessiva quantidade de sangue nas paredes.

Matthieu pegou em Madalena e zarpou dali para fora a voar. Se ia meter estacas de madeira, água benta e espadas, ele não queria estar ali.
Quando Madalena o sentiu a pegar nela, começou a ficar toda excitada.
- Este gajo! – pensou ela – vê lutas e pensa logo noutras coisas – e agarrou-se fortemente a ele e começou a suspirar.
Matthieu engoliu em seco. Da próxima fugia sozinho.

Anfira virou-se para Filia Santíssima com a sua panóplia de armas e sussurrou para Zaen:
- Que pena seres satânico e nós não sermos casados. Odiava morrer neste combate sem ter desfrutado dos prazeres carnais inerentes a esse belo sacramento da igreja.
Filia paralisou. Era demasiado bom ir assassinar aquela gente toda, agora era deprimente aquela Super Cristã ser tão cristã assim. E, quando pensou nisso, de a Anfira ainda não ter experimentado aquilo, deu-lhe um ataque cardíaco e evaporou-se ao som de Grieg.

Zaen, que até aí não tinha entendido grandemente coisa nenhuma, quando finalmente conseguiu decifrar o que Anfira lhe tinha dito ficou branco (ok… ele já era branco por causa do pó-de-talco que usava para lhe dar aquele ar poser satânico, mas ficou ainda mais branco). Começou a desejar um buraco para se esconder de Anfira, porque casamento era uma palavra que não existia no seu dicionário satânico. E foi com tanta força que desejou por um buraco que, sob os seus pés, se abriu um wormhole e ele sumiu nele.

Vyrmack ficou deprimido (mais ainda, se tivermos em conta que ele é emo) e com uma enorme vontade de cortar os pulsos enquanto se enforcava (sim… isto tudo ao mesmo tempo), pois nunca lhe tinha ocorrido que se podia ter aberto um wormhole onde ele morava. Podia ser a sua oportunidade de voltar para o seu habitat natural, o R7P3I.

Anfira começou a chorar copiosamente. Apesar de Zaen ser poser, ela tinha uma ternura muito cristã por ele, e puxou de um dos seus muitos rosários e começou a rezar pela alma do seu querido amado, assim como pela sua rápida conversão. Depois olhou para Vyrmack. Puxou de outro rosário e, como era a Super Cristã, começou a rezar este e continuou o outro, apenas com uma pequena diferença de fase entre as duas orações.

Matthieu estava já a milhas com Madalena quando com os seus sentidos super-hiper-mega-ri-fixes e ultra desenvolvidos verificou que, naquele universo, já não havia Zaen. E disse a Madalena:
- Ainda bem que viemos embora. Neste momento, a banda de metal fofo perdeu o vocalista.
- Então porquê? Ele não levou mapa para a casa do Vyrmack?

Matthieu, se estivesse vivo, tinha morrido de certeza. Mas ele sabia que Madalena até era inteligente… mas não era bem normal. E, com muita, muita, muita calma, explicou-lhe que não sentia a presença de Zaen naquele universo.
- Oh! Tadinha da Anfira! E eu que pensava que era desta que ela deixava de ser uma cristãzinha irritante.
Desta vez foi Matthieu que ficou excitado. Aquela Madalena, afinal, era mais maléfica do que ele tinha pensado.
E comeram-se logo na nuvem mais próxima…